Dos instrumentos aos arranjos: é notável o cuidado da banda para escolher e encaixar cada detalhe em seu quarto disco, conferindo um tom singular às canções e guiando o ouvinte para o universo particular da banda
Texto Isabela Guiduci
Foto Lucca Mezzacappa
Mais colorido, brasileiro e dançante, porém igualmente intimista: é assim que Best Kept Secret (“Melhor segredo guardado”, em tradução livre), quarto disco do Moons, chegou ao mundo. Lançado em 10 de junho pela Balaclava Records, em parceria com a Diskunion, no Japão. Encare o disco como um convite esmerado para um momento de reflexão sobre temas existenciais e sentimentais.
“Uma das coisas mais legais que a música e a arte têm é a possibilidade de reinterpretação, é algo que depende muito das sensações de cada um de nós. Inclusive, não gosto de explicar muito sobre o que são as letras, porque penso que acaba limitando a interpretação, e a mágica está nisso. Obviamente, elas têm um significado para mim, mas quando chegam em outra pessoa, podem ser outra coisa. A magia de lançar um disco e ter uma banda está nisso”, comenta o vocalista André Travassos em entrevista à Revista Balaclava.
Cada uma das nove faixas que compõem o disco esconde seu próprio segredo. A banda, que além de Travassos, conta com Bernardo Bauer (baixo e voz), Felipe D’Angelo (teclado e voz), Rodrigo Leite (guitarra e gaita), Jennifer Souza (guitarra e voz) e Pedro Hamdan (bateria), mergulha em diferentes simbolismos, além de dividirem questionamentos frente aos desafios de uma realidade pandêmica.
“Muitas reflexões pessoais surgiram nesses dois anos parados. Teve todo o lance de despedidas e mortes, que também serviram de inspiração de alguma forma. Tem algumas músicas no disco que abordam a temática da morte, da despedida, da vida após a morte. Não conseguimos fugir dessa questão, por conta dos anos vivendo o luto de partidas e das reflexões dos momentos em que estávamos sozinhos com nós mesmos”, explica Travassos.
O tom emocional está longe, porém, de refletir apenas essas inquietações. Destaque em lírica e sonoridade, “Childlike Wisdom” apela a uma sensibilidade melancólica ao expor a grandiosidade da sabedoria e inocência infantil. A faixa está entre as preferidas da banda, e o vocalista conta ser a canção mais especial do disco pelo seu significado.
“É uma música que fizemos para minha filha (Elis) e para filha do Bernardo (Rosa). Agora, elas sãoas mascotes da banda. Tem essa questão emocional muito forte e, no final (da música), tem a Rosa falando nossos nomes e apelidos, e a gargalhadinha da Elis. Por conta dessa participação, acho que é a música com um maior apelo emocional para nós”, divide.
Em uma espécie de ambientação musical sensível, que guia toda a contemplação da obra, a sonoridade é rica e repleta de detalhes, com as faixas referenciando uma elegância sonora inspirada na música do período que se estende entre as décadas de 1960 e 1980. Dos instrumentos aos arranjos: é notável o cuidado do Moons para escolher e encaixar cada detalhe, conferindo um tom singular às canções e guiando o ouvinte para o universo particular da banda.
Travassos conta: “Neste disco, queríamos algo mais planejado, ter mais tempo para trabalhar as músicas. Tinha dois anos praticamente sem tocar, e marcamos duas imersões em um sítio. A primeira vez fomos e compomos. Já na segunda, fomos com o nosso produtor, Leonardo Marques, para fazer a seleção do repertório e começar a pensar em como o disco ia soar e quais elementos queríamos trazer para este trabalho. Foi feito com um pouquinho mais de calma.”
Experimentando novos caminhos
Pelos elementos sonoros, o álbum está mais elétrico e distante do folk presente nos primeiros trabalhos, e um exemplo representativo dessa adição é a faixa “Let’s Do It All Again”. Segundo o artista, ela é, inclusive, uma música especial para a banda por resumir as influências que os integrantes estavam consumindo nos últimos anos, incluídas até mesmo nos shows. Há algum tempo, o grupo flertava com “esse universo mais dançante, meio anos 1980”.
O lado mais enérgico não é a única novidade. Há uma brasilidade aflorada no novo trabalho do Moons, principalmente por conta da presença do violão de nylon, peça importante para representar essa faceta até então não tão evidente. “Sempre escutamos muita música brasileira e sentimos que esteve no nosso som de alguma maneira. Quando você traz um instrumento que é o símbolo da música brasileira, o violão de nylon, isso fica mais fácil de ver. O instrumento chega com um tanto de composição e de caminho para você seguir. E foi muito natural, não foi uma coisa que a gente pensou ‘vamos dar um toque brasileiro para o nosso som’.”
Apesar das novas particularidades da banda em Best Kept Secret, ainda há um diálogo significativo entre os discos: a sensibilidade confessional. O vocalista pondera: “O elemento de ligação de todos os nossos trabalhos e, talvez, a principal característica do Moons é essa coisa da intimidade que as músicas têm.” E, de fato, essa magia intimista reverbera ao longo de todo o quarto álbum.