Saindo do quarto e chegando à cena alternativa paulistana,
Gab Ferreira está a procura de inspiração
para seu próximo álbum em meio ao caos da cidade grande
Texto Mariana Marvão Foto Diola Gabriele Assistência Luciana Barreto
Styling Acervo, brechó Tylera e Alfredo Que Me Encontre
Direção de Arte Thais Jacoponi
(Essa matéria foi publicada originalmente na quinta edição impressa da Revista Balaclava, lançada em novembro de 2019).
Gab Ferreira chegou em São Paulo com um propósito: fazer música. Nascida em Criciúma, cidade no interior de Santa Catarina (a população totaliza volta de 210 mil habitantes), ela não imaginava que, um dia, suas músicas chegariam a ter mais de 1 milhão de visualizações. Embora sempre tenha gostado de cantar – aos 12 anos, a pequena já participava de um coral –, trabalhar de verdade com música nunca foi considerada uma opção viável. Sintomas da vida no interior.
Em 2016, contudo, isso começou a mudar. Depois de terminar o Ensino Médio, Gab tomou coragem, gravou um vídeo e mandou para o The Voice Brasil. “Meio que me inscrevi no programa como uma piada, porque todo mundo fala para a galera que canta ‘se inscreve no The Voice, vai que dá certo’. Eu vi que estava nos últimos dia de inscrições. Era uma da manhã, eu estava em casa, fazendo absolutamente nada, falei ‘foda-se’, vou gravar um vídeo muito mequetrefe e vou mandar”. E deu certo, mesmo.
Ela foi selecionada, mas o desajuste com o mood geral já começou no figurino. “Galera maquiada, cabelo, umas minas com casaco de pele e eu ‘será que errei no dress code?’” Apesar de ser um peixe fora d’água, Gab chegou até as semifinais do programa – o que a rendeu nada menos que 50 mil seguidores no Instagram. “Eu sabia que a Globo é muito grande, mas é sempre um choque perceber que realmente chega a tudo isso de gente.” Depois de sair do palco do reality, sobrou uma pergunta incômoda: será que essa experiência/exposição mais atrapalhou do que ajudou? “Eu não posso mentir e falar que foi só uma bosta, porque não foi. Foi muito importante. Eu era de Criciúma, uma cidade em que esse espaço não existe. Ter ganhado esse público, antes mesmo de lançar qualquer coisa, de certa maneira, foi muito bom.
Quando lancei meu primeiro trabalho, as pessoas prestaram atenção – consegui chegar a mais pessoas do que se tivesse começado do zero. Ao mesmo tempo, vem uma pressão foda porque você não tem margem de erro.” O registro em questãoé a mixtape Lemon Squeeze (2018), a mistura entre um ambiente ensolarado à beira da piscina e uma sonoridade lo-fi (referências convergem para Mac DeMarco, Clairo e Homeshake). “No lançamento, eu estava ‘caralho, que tesão’ de ver uma coisa pronta que partiu das minhas ideias”, relembra. Uma das faixas de LS, Not Yours, foi a responsável pela marca de 1 milhão de visualizações no YouTube.
“Nessa fase da mixtape, eu não estava pensando em nada. Vou lançar essas músicas, ver no que dá. Se der bom, beleza, se não der, bola para frente, pensamos em outras coisas. (…) Agora acho que estou em um lugar mais confiante, estou recebendo muitas coisas novas e tudo isso está me ajudando a ter uma clareza maior para qual caminho eu quero seguir dentro do que estou fazendo.”
Sua vinda para São Paulo tem tudo a ver com essa nova fase. Mesmo sendo uma grande mudança, Gab se sentiu preparada para isso. “Eu já tinha extraído tudo o que eu podia estando lá. Chegou uma hora que já não estava mais dando certo fazer as coisas à distância, minha proatividade caiu.” Com a ajuda da também cantora e compositora YMA, em abril de 2019, ela veio se aventurar no caos paulistano e acabou sendo conquistada por ele. “Eu nunca quero perder esse sentimento que tenho ao estar aqui. De achar tudo ‘muito diferente’, ver uma realidade muito oposta, tudo acontecendo ao mesmo tempo, esse mix, essa confusão. Para mim, é muito bonito. Eu amo muito São Paulo”, elogia.
“Nessa fase da mixtape, eu não estava pensando em nada. Vou lançar essas músicas, ver no que dá. Se der bom, beleza, se não der, bola para frente, pensamos em outras coisas”
Sua história com YMA, aliás, veio antes de sua mixtape. Juntas, em 2018, elas lançaram uma música e o que era uma “webamizade”, virou uma parceria. “Rolou uma identificação porque nós duas cantamos e trocamos muita ideia sobre isso. Aí, ela me mostrou Summer Lover e logo que eu ouvi já me imaginei fazendo parte daquilo, queria muito estar naquela música”. Duas semanas depois: versos completos. Um mês depois: Gab já estava comprando as passagens para São Paulo. Ela se hospedou na casa de Yasmin e as duas se dedicaram a gravar o clipe. “É muito louco, o fluxo do vídeo foi muito natural. Não teve pressão em nenhum momento. E ele ainda tem toda essa estética que a gente ama: ‘girl’s world’, cor de rosa, coisas fofas. Lembro da gente na casa dela fazendo as dancinhas e rindo muito. Era todo mundo no estúdio fazendo zoeira. (…) A minha conexão com a Yasmin é muito da hora. É legal, porque a gente já conversou muito sobre isso, como nosso projeto é uma coisa que a gente consegue explorar umas paradas que não fazem sentido no meu trabalho, não fazem sentido no trabalho dela e daí a gente tem esse lugar que é meu e dela que a gente pode não ligar muito e fazer umas coisas que a gente só quer fazer”, explica sobre a dinâmica em dupla.
Morando há quatro meses em São Paulo, Gab já começou a produzir uma música nova, com a ajuda do RØKR, que também está fazendo os shows com ela. “Acho que meu rolê é muito mais focado em voz do que nessa coisa de instrumento. Está sendo legal estar redescobrindo o que outras pessoas podem trazer pro mix. Porque se depender de mim, trago tudo muito para trás. Deixo tudo muito lento, tudo muito parado. Eu queria ter umas músicas da Rosalía, um poperô travadaço.”
Até o final do ano, a cantora pretende lançar esse single e começar a pensar no próximo álbum. “Meu grande sonho próximo é lançar um disco da hora e fazer uma tour internacional, tocar em uns lugares massas e que as pessoas apareçam. Minhas metas são mais de show. Conseguir desenvolver esse show, para ser uma coisa meio grandiosa e poder fazer tour, poder levar pras pessoas. Eu vejo interesse de galera de fora. Queria fazer muito uma tour no Japão, eu piraria muito. Poder ir pra vários lugares, ter essa vida todos os dias: amanhã eu tô indo pra França, depois eu vou para a Hungria, depois eu vou pra um vilarejo na Eslovênia porque a galera pira lá. Ia ser muito engraçado. Meu grande objetivo de vida, que eu faça um show e as pessoas apareçam. É bem simples. Acho que é realista (risos).” ☺