Leveze e
The Soundscapes falam sobre vida e música

Parceiros de longa data, a dupla Zé Lanfranchi e Rodrigo Carvalho colaborou em uma faixa do EP Aclimação 12-20.

Texto Isabela Yu
Foto 
Janaina Doca

Velhos conhecidos da cena indie paulistana, os músicos Zé Lanfranchi, ex-Cabana Café e Parati, e Rodrigo Carvalho, do The Soundscapes, lançaram uma música em conjunto. A faixa “Secrets Over Cigarettes”, faz parte do trabalho Aclimação 12-20, estreia do projeto Leveze, nova empreitada do Zé (ou Zelino). O trabalho foi gravado no estúdio Mono Mono, com mix e master do Roberto Kramer (Røkr) e lançamento pelo selo Cavaca Records. O álbum conta ainda com participações da Rita Oliva (Papisa), do rapper francês Romain Destouche e do Fernando Dotta (Balaclava Records/Single Parents).

Em agosto de 2020, o artista apresentou a música “Aurora”, que já anunciava alguns traços de seu mergulho na estética eletrônica, pense ambient music com indie, post rock e shoegaze. Com “Secrets Over Cigarettes”, viajou para a sonoridade da banda canadense Broken Social Scene. Desde o início, sabia que a composição precisava ganhar os vocais do Rodrigo: “Sentia que a música tinha um ar de energia e nostalgia, algo que sempre senti no BSS. Essa banda nos uniu. Com a letra e voz dele, o instrumental ganhou uma história linda, ela me leva pro tempo em que descobria a noite, emendava os dias e viajava com amigos”.

Para comentar a parceria, os músicos visitaram lembranças e comentaram processos criativos na troca de perguntas a seguir:

Rodrigo Fala Zé! Como você tá? Tudo Leveze?

Zelino Cada dia mais Leveze! (risos). Se bem que tivemos uma semana e tanto com essa produção de clipe, pode-se dizer. Levamos alguém à loucura?

Rodrigo Acho que a equipe deve ter chegado a loucura sim (risos). Mas foi bom para nos aproximar, mesmo que virtualmente. A última vez que a gente se viu foi no Balaclava Fest de 2018.

Zelino Uou! Muito tempo, mas lembro desse encontro, foi rápido mas sempre com uma troca incrível.

Rodrigo Foi bem legal a nossa conversa, fraterna, recíproca, saudosa. Pareceu que você estava em um período itinerante naquele momento, ao mesmo tempo que existencial e musical.

Zelino Sim! Esse período ainda segue vivo dentro de mim, mesmo em casa agora, não sinto que terminou. Fiquei um tempo na Califórnia, deixando de lado a produtora de vídeo que eu tinha, trabalhei em fazenda, morei em comunidade, roadtrips, festivais e muitos rolos de filmes… é bom se perder pra encontrar algo novo. Você também teve um período no EUA, sabe como é.

Rodrigo Sei bem! Em 2002, meu irmão passou alguns meses nos EUA, peregrinou pela Europa, se fixando em Londres, depois voltou para NYC. Eu disse para ele, “hey, vou junto, e se prepara porque nós vamos desenvolver nossa música por lá”. Não havia planos, duração, prazo, nada de concreto. Ficamos 7 anos. Quando penso, foi como se estivéssemos matriculados em uma Universidade do Rock. Com certeza, elevou nosso nível de composição e entendimento, do modus operandi do indie, e nossa noção e referência estética. Nos seus trabalhos, você deixa bem claro que também tem essa bagagem, mas queria que você falasse um pouco sobre os seus primórdios musicais.

Zelino Com 13 anos, eu e alguns amigos costumávamos levar os amplis e guitarras em bicicletas e skates para um sótão, ao lado de uma pista de skate. A gente passava a tarde tocando cover de punk e hardcore, rindo muito e tomando coca-cola. Incrível como essa experiência foi empoderadora. A energia de cinco pessoas tocando ao mesmo tempo pode ser avassaladora. Me apaixonei por criação naquele instante. Não me lembro da minha primeira composição, mas lembro de ligar para meu amigo de banda e trocar via telefone discado. Depois de experimentar isso, sofremos uma maldição, não é mais possível abandonar.

Rodrigo Uau, bem isso! Muito parecido com o que aconteceu conosco, eu, meu irmão e meus amigos durante nossa adolescência em Maringá. E sinto isso no lançamento de Leveze. Para mim, é como um diário seu, com anotações sonoras de suas imersões antigas e mais recentes. Foi um presente e tanto, quando em setembro de 2014, recebi duas de suas tracks novas e você falando: “mano, ouve esse material, queria que você desenvolvesse os vocais!”. Disse uau antes mesmo de ouvir.

Zelino Pois é! A jornada pode influenciar… O tempo me ajudou a amadurecer elas. As que te mandei, por exemplo, veio da nossa afinidade por Broken Social Scene, foi o elo que me levou até você. Senti algo de BSS e Soundscapes nelas, a melodia que vinha a minha cabeça era na sua voz. Isso sempre me fascinou no The Soundscapes, tanto na guitarra como na voz. Soam como uma nostalgia agridoce, como um grande compositor clássico. Você tem influência desses grandes compositores? Como funciona para você essa relação harmonia x melodia x letra?

Rodrigo A coleção de álbuns de meu pai é predominantemente de música clássica, então ouvi muito, e gosto, ouço sempre. Basicamente, estudo e absorvo vários estilos musicais, várias estéticas artísticas. Então, não sei se isso é percebido, mas para mim, tudo o que eu faço é uma mistura de referências liquidificadas numa mesma música. Não sou purista de estilo musical, tenho minhas preferências e também as influências que ressoam mais, mas sinto que tudo o que componho vem até mim como de um plano espiritual. E falando nisso, você se tornou bastante prolífico em termos de estilos musicais. Você chega a planejar esses saltos estéticos ou eles acontecem em você intuitivamente?

Zelino Como você disse, não sou purista com estilos. Acho que músico, em geral, é um sujeito curioso. Gosto de experimentar novas influências, estéticas, até como exercício. Foi assim nos projetos anteriores, cada um tem características bem definidas. Já no caso do Leveze, a ideia é mais heterogêneo, ser uma válvula de escape, não necessariamente se limitando a um estilo. Aclimação 12-20, cria um retrato que gosto muito, mas a ideia é expandir ainda mais esse cenário. Tenho algumas tracks de ambient, house, d’n’b e hiphop lo-fi, que também quero lançar em breve. ☺

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